Acrescente ao processo de aquisição do veículo uma grossa camada de burocracia, muito vai e vem, muita roda de cadeira para gastar. São tantas etapas a cumprir que a felicidade custa a aparecer.
E quando o assunto é o test-drive? Aí a distância entre desejo e certeza fica muito inalcançável. Isso porque não existe no Espírito Santo, Estado onde vivo, nenhuma concessionária com carro adaptado para a pessoa com deficiência fazer a voltinha dos sonhos com o modelo que deseja comprar. Acredita?
Test-drive ainda é sonho – minha experiência se deu nesta semana, senti na pele o que é testar sem dirigir. E sempre foi assim. Nunca existiu um carro com adaptação nas lojas. Combinei com o vendedor que, solícito, trouxe o carro até minha casa para fazer o teste. Resolvi perguntar, mesmo sabendo a resposta: Está adaptado? Com cara de espanto e desolado, respondeu: Não.
Antes de entrar, olhei o porta-malas e constatei que não teria problemas quanto à minha cadeira de rodas. Me transferi imediatamente e com facilidade para o carona para apreciar o carro. Se para o cego, o bom seriam os olhos, para o cadeirante o bom seria caminhar, para os surdos, os ouvidos, no test drive o bom seria dirigir. Como tomar a melhor decisão se não consigo saber o desempenho do carro, como é a transferência da cadeira para o banco do motorista, e outras informações sobre o produto que quero comprar?
Promover a acessibilidade é simples – se para as demais pessoas essa avaliação se dá na prática, para as pessoas com deficiência, no caso física, ficam apenas as hipóteses. Sem poder experimentar o carro, a desistência quase sempre é o caminho. Ou o risco é a opção. Quando falamos em inclusão de pessoas com deficiência, muitos ainda relacionam o assunto à pena, migalhas e caridade. Ah, já tem o desconto dos impostos, e isso basta, você deve estar pensando. Sobre esse tema, dos descontos, podemos falar também. Aliás, tem sido um imbróglio desde o ano passado.
Foram centenas de anos em que a pessoa com deficiência viveu em isolamento, exclusão e invisibilidade e não é fácil – ainda – mudar. E pensar que pessoas com deficiência têm o direito de fazer test-drive para avaliar sua compra, deve ser algo tão fora da gestão das concessionárias, quanto é para nós inadmissível tal conduta. E olha que é tão rápido resolver isso. Promover a acessibilidade é bem mais simples do que parece.
Alô, concessionárias!!!
Listei alguns itens que se avalia quando se faz, na prática, um test-drive: direção, câmbios, motor, suspensão, freios, visibilidade, se a cadeira cabe no porta-malas, posição do motorista, ar-condicionado, inovação, respeito, equiparação de oportunidade, direitos, dignidade, acolhimento, autonomia e felicidade.
Tenho certeza de que esses itens, caso estejam presentes no teste, ainda que necessitem de ajustes, permanecerão para sempre na agradável experiência da compra do carro novo e dos sonhos.
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